domingo, 12 de fevereiro de 2017

O medo em um conto

Foto por Evellyn Bento

Era a quarta vez que eu estava ali, parado no espelho, ajeitando aquela blusa social tão desconfortável e tentando parecer não tão nervoso. “Ó céus, melhore essa cara, é só uma entrevista de emprego!”, eu dizia ao meu reflexo. Mas, é claro que falar era muito mais fácil. “Talvez se eu estivesse usando aquela minha camisa do Batman eu ficaria bem mais confiante... Ok, já passei tempo demais na frente desse espelho, estou parecendo até minha mãe!”.

Peguei minha maleta, e saí. E ao pisar do lado de fora do prédio, não pude deixar de observar o quanto o tempo não estava ajudando. O sol, parecia ter sido sequestrado, as nuvens estavam densas e escuras, é, isso com certeza era um ótimo sinal. Resolvi olhar as horas para ver se realmente ainda eram duas da tarde, e DROGA, eu estava vinte minutos atrasado.

A ideia, inicialmente, era fazer uma caminhada até o gigantesco edifício da indústria de pesquisa e tecnologia afim de conter meu nevorsismo, mas, com esse curto espaço de tempo, não haveria outra forma a não ser pegar um táxi até o local. “Será que não tem jeito disso ficar pior?”. E o som de um trovão ecoou pela cidade assim que entrei no táxi. “Mas é claro, com certeza poderia ficar pior!”. Se antes o tempo já não estava dos mais calorosos, agora, o cenário havia ficado sombrio, a cidade estava escura, fria e... úmida, e eu só olhava pela janela do carro, torcendo para minhas mãos pararem de tremer e minhas pernas pararem de balançar com tanta rapidez.

“Aqui, sim?”, ah sim, esqueci de mencionar, o motorista do táxi falava muito mal o meu idioma, se ele entendeu o local para onde eu queria ir? Eu acho que não, pois acabávamos de estacionar em frente a um prédio abandonado e macabro, numa rua que eu desconhecia. “Para onde o senhor me trouxe, ainda estamos na cidade?” eu perguntei aflito. “Seu destino, na sua frente!”, ele respondeu com uma feição confusa. “Esse não é o prédio certo, olhe para esse local, está abandonado, caindo aos pedaços! Por favor, senhor, o edifício fica no centro!”, eu expliquei, mas ele ainda parecia confuso.

Certo, eu não poderia perder mais tempo, decidi abandonar aquele táxi bem ali, e pegar outro, que de preferência o motorista entendesse minha língua, mas, eu esqueci de um pequeno detalhe, ao sair de casa, eu não peguei meu guarda chuva, e o resultado de tudo isso foi: roupas ensopadas e um motivo a mais para tremer.

A rua estava deserta, e a chuva cada vez mais forte, a única marquise era a do prédio abandonado. Eu não tive escolha a não ser me abrigar embaixo dela. Eu observava a espera de avistar um táxi, mas eu não via nenhum carro, apenas algumas poucas pessoas maltrapilhas e com feições nada amigáveis, com certeza não era um bairro muito frequentável. Até pegaria o celular afim de ligar para alguém vir ao meu encontro, mas não ali. Olhei para o relógio e faltavam apenas dez minutos para a entrevista começar, meu coração estava quase saindo pela boca, foi quando ouvi alguns passos e uma risada assustadora logo atrás de mim. Tomei coragem e olhei para trás, e, teria sido muito melhor se eu não tivesse olhado.

Eu não consigo nem descrever o pavor que me invadiu naquele momento, à minha frente, uma criatura pavorosa me olhava com um sorriso maníaco. Seu rosto estava pintado de branco, seus dentes continham sangue, que manchava-lhe a boca. Seus olhos eram negros e assustadores, ele trajava uma roupa circense, e, podem me chamar de maluco, mas ele parecia um palhaço de festa de aniversário, mas possuído por um espírito maligno. Seu movimento ao agarrar minha camisa e puxar para dentro daquela construção medonha foi tão rápido que não consegui reagir, ele me arrastou para uma sala escura e com odor pútrido, com paredes manchadas de sangue e ratos mortos espalhados pelo chão. Meu estômago embrulhou, e a criatura me empurrou para o chão. Eu tentei fugir, mas ele havia trancado a porta, e ao me observar tentando abri-la inutilmente, soltou uma gargalhada que gelou minha espinha.

O palhaço apanhou um machado e acertou com ferocidade um rato que estava por ali. “Seu nome!”, sua voz era bizarra e perturbadora. Eu estava amedrontado, não consegui responder.   “Seu nome, garotinho”, e soltou mais uma risada. “Ph-phillip”, eu disse gaguejando. Ele então se virou para mim, e balançou o machado. “Isso é para você!”, e mais uma vez aquela risada ecoou pela minha mente.

Eu estava paralisado, amedrontado, aquele olhar estava sob mim por tempo demais, e o terror me fez sentir completamente impotente. Ele apenas me olhava, balançando o machado de um lado para o outro, parecia me analisar internamente. Foi quando sua expressão mudou, e ele finalmente parecia ter tomado uma decisão. Eu senti, que ali, naquele lugar desconhecido e terrível, em frente a uma criatura amedrontadora, seria meu fim. Ele levantou o machado e eu apenas fechei os olhos. “Phillip Maters, você está contratado!”. Aquela simples frase, me fez abrir os olhos, o reflexo do sol, vindo de uma enorme janela de vidro, batia em meu rosto. Á minha frente, um senhor forte, vestindo um terno aparentemente caríssimo, estendia a mão para mim, eu estava sentado numa cadeira confortável, num escritório luxuoso, no último andar do edifício da renomada indústria. Eu rapidamente apertei sua sua mão com um enorme sorriso. Aquela frase, desfez meus medos. Aquela frase, mudou a minha vida.



Se você chegou até aqui, agradeço profundamente! Este conto foi escrito por mim, Caroline Eulália, em resposta à um desafio feito por minha parceira do HSF, Carla Lorena, onde eu deveria escrever um conto que abordasse um medo.
Ah, e a bela imagem que ilustra esse post, foi fotografada na nossa cidade, Juiz de Fora, pela incrível fotógrafa Evellyn Bento! Se eu fosse você ia correndo conferir mais imagens feitas sob o olhar dela em seu Instagram e em seu Flickr, garanto que você não vai se arrepender!


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